Eu não encontrei esse texto em português em lugar nenhum, então fiz um esforço para traduzir do francês e postar aqui.
Meu francês não é muito bom e eu peço desculpas.
Todas as aspas, parênteses, chaves, negritos e itálicos estavam assim no original.
Eu não irei a Yellowstone
Há algumas semanas, cruzei as Montanhas Rochosas de carro. Eu estava nos EUA para uma série de reportagens que devem preencher um livro no qual estou trabalhando. Eu sempre quis ir a Yellowstone, um dos parques naturais mais célebres da América do Norte, na fronteira entre Montana, Wyoming e Idaho, um canto perdido de altos vulcões, gêiseres e grandes vales cobertos de pinheiros e abetos e onde os animais selvagens são abundantes, livres, longe das cidades e das rodovias.
Eu sonhei muito com a América, realmente! Meu espírito viajou freqüentemente pelos topos das Rochosas, e compartilhou tendas com os índios sob os ramos das árvores, enfrentou corredeiras na pista de Lewis e Clark, ou caçou ursos com Teddy Roosevelt. E eu tinha certeza de que um dia veria como é Yellowstone, cujo nome evoca com a mesma força em mim o vigor do mundo antigo e sua beleza irreprimível.
Creio que tudo está morto em Yellowstone, ou quase, e eu não irei lá.
A algumas milhas da nascente do Colorado; julho de 2010 [foto de Matthieu Auzanneau]
Ao longo dos últimos quinze anos, ao longo de toda a cadeia das Montanhas Rochosas, um pequeno besouro que se alimenta da casca das árvores tem devastado milhões e milhões de hectares das florestas frias de altitude. O aumento das temperaturas registrados tanto no verão quanto no inverno na América do Norte permite que esse inseto se reproduza cerca de duas vezes mais rápido do que antes. Sua população não pára de crescer. Do Círculo Polar Ártico ao México, as conseqüências têm tomado nos últimos anos dimensões assustadoras.
Oito anos atrás, no Alasca, eu já havia tido o coração partido por esse espetáculo de florestas petrificadas, vazias, silenciosas! Em suas bordas, havíamos filmado homens que tentavam cortar o mais rápido possível as árvores mortas, antes que a seca causasse os incêndios cataclísmicos que a América do Norte agora enfrenta a cada verão. Eu criei, então, o primeiro documentário francês mostrando as conseqüências humanas do aquecimento global. Estas imagens mórbidas me assombraram muito, e inspiraram também.
E este ano, sem ter realmente procurado, encontrei-me novamente em meio às árvores mortas. Então eu mudei o curso, atravessei as Rochosas pelo caminho mais curto, fugi para o deserto de Nevada; eu renunciei a Yellowstone, incapaz de suportar, mesmo para uma reportagem, a projeção concreta de nossa impotência durante dias inteiros de estrada.
Carl Jung, um dos pais da psicologia, observou há muito tempo que «as pessoas não conseguem enfrentar excesso de realidade.» A ironia desta frase enfureceu-me por muitas horas, quando eu estava procurando uma maneira de sair da floresta morta.
Sozinho ao volante, tive a sensação megalomaníaca e trágica de tomar na cara o diagnóstico do bom e velho Carl em nome de toda a humanidade.
Encontrar-me quase por acaso no meio de milhões de pinheiros mortos, seis meses após a farsa da conferência de Copenhague sobre o clima...
Por que essa cegueira? Como pode o estado de emergência climática não ter sido declarado por Washington, enquanto a floresta enraizada na espinha dorsal dos Estados Unidos está morrendo? Inacreditável.
[Um relatório publicado em julho pelo United States Forest Service e pelo Natural Resources Defense Council mostra que mais da metade dos pinheiros com casca branca das Rochosas está morta, e que um quarto vai morrer em breve. Isso é o que foi noticiado no fim de julho em um pequenino editorial no rodapé do New York Times, que conecta a epidemia ao aquecimento climático. 80% das florestas da Columbia Britânica podem ser destruídos até 2013, prevê o Natural Resources Canada.]
Próximo às nascentes do Colorado, eu fiz a pergunta acima a um velho senhor barbado sentado em sua caminhonete. Ele estava ali, parado ao longo de uma estrada deserta, o olhar perdido frente à montanha descarnada, um boné Stars and Stripes desbotado encaixado sobre o crânio. Com o sotaque forte do povo do vasto Oeste, ele respondeu, sem convicção: «Eles fazem carros que engolem menos gasolina hoje, e depois fazem uns solares aqui e ali.» Ele não parecia muito convencido. Nós olhamos a floresta em silêncio. E então ele acrescentou, quase para si mesmo: «Ficou muito ruim nesses últimos anos. Temos mais é que rezar pra que tudo queime e que alguma coisa rebrote.»
Na estrada, finalmente vi uns pequenos aglomerados de jovens abetos de um verde benevolente crescendo aconchegados aos pés de seus pais. É idiota, mas eu pensei no destino dos búfalos e dos índios.
Mais tarde, li a seguinte frase no jornal do parque natural das Rochosas: «O problema do inseto comedor de casca (está) lá para nos lembrar da capacidade da natureza de mudar para além do controle dos homens»... O controle dos homens... O sofisma fedia a marketing turístico, e eu comentei isso com um ranger, oficial responsável pela proteção da natureza. O homem me explicou que, em meados da década de 2000, havia existido um programa de informações e passeios educativos sobre o aquecimento global. «Mas não havia muitas pessoas interessadas em participar, por causa das implicações. Há muita controvérsia sobre o assunto, entende, então eles pararam.»
O que “eles” não vão parar, podemos dizer, é de perfurar em busca de hidrocarboneto, o sangue do American Way of Life do qual a sociedade tecnológica parece pouco precisar (por assim dizer). Por toda parte, nas Rochosas, há dois ou três anos, um novo sistema de extração prolifera como cogumelos. Ele serve para "melhorar" o gás de xisto (shale gas), uma forma de gás natural dita "não-convencional", considerada até agora insuficientemente rentável, mas que as empresas de energia começaram a explorar a fundo, na falta de coisa melhor. É sem dúvida uma das últimas corridas em busca de combustíveis fósseis em território americano, um século e meio após as primeiras.
A floresta morreu, e ao redor dela, ganância e necessidade produzem ainda mais veneno.
«Drill, baby, drill!» (Sarah Palin) [fotos de Matthieu Auzanneau]
«As pessoas não conseguem enfrentar excesso de realidade.»: o veredito de Carl Jung não tem recurso.
Na highway 70 que vai de Las Vegas a Denver, a linha divisora de águas entre o Atlântico e o Pacífico, encontrei-me preso em um engarrafamento a cerca de 3000 metros de altitude. Ao nosso redor, a floresta se decompunha a perder de vista. Era um domingo à noite, os moradores do estado do Colorado voltavam de seu fim de semana à beira dos lagos dos altos vales. Muitos puxavam a reboque seus jet skis. O povo do Colorado é conhecido pelo seu amor à natureza. O engarrafamento durou tanto tempo que me fez perder o meu avião para Washington.
[foto de Matthieu Auzanneau]
Entre os motoristas naquela noite, eu não sei quantos pensavam sobre as mudanças climáticas, ou meditavam a respeito dessa nossa incapacidade de enxergar as conseqüências da nossa dependência de combustíveis fósseis (em um dado momento, como que para me fazer parar, dois enormes jatos militares passaram raspando sobre os picos; o exército treina com freqüência nesta região pouco habitada). As florestas devastadas das Rochosas são muito distantes das megalópoles do Leste e da Califórnia. A morte dos pinheiros e abetos é facilmente esquecida. Fecha-se a porta e liga-se o ar condicionado. De qualquer maneira, a maioria das pessoas ignora completamente que ela ocorre.
Nos dias de verão em Washington DC, ao pé de cada edifício oficial, grandes placas de ventilação vomitam milhões de metros cúbicos de ar quente, empurrados com um rugido do inferno pelos sistemas de ar condicionado.
[Os gases refrigerantes usados na climatização escapam e aumentam o efeito estufa. Assim como a decomposição da madeira, que libera metano, outro poderoso gás estufa.]
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